segunda-feira, 23 de julho de 2012

Abrindo os olhos para a Impermanência



Após largar a vida de lutas sem sentido, entrar para o “Monastério Budista” e tornar-se um bikshu (monge budista), Yang Ho, com a mesma dedicação que tinha ás artes marciais, estudou sem parar todos os “Sutras  Budistas” aos quais teve acesso.

Ele aprendeu e recitava grande parte dos mantras sagrados, mas toda essa dedicação não o ajudava a entender a “Impermanência” que o Tathagata Shakyamuni  falava nos Sutras.

Ele costumava questionar os mais sábios mestres no mosteiro, mas sempre ouvia a mesma resposta:
- Tudo que está sujeito a surgir, está sujeito a Impermanência...

Por algum tempo isso o deixou frustrado...

Por ser um bikshu  noviço, ele não tinha acesso aos sutras que detalhavam mais essa questão.

Certo dia, ele resolveu sair do Monastério e meditar próximo a um rio para ver se conseguia entender essa questão...

Chegando próximo ao rio, ele sentou-se embaixo de uma árvore em posição de lótus e fixou seu olhar no rio, iniciando assim, sua meditação...

No início de sua meditação, surgiu um pescador que começou a falar com ele.

Yang tentou manter o foco, mas o pescador mais e mais falava...

Ele quase perdeu a paciência, quando lembrou-se que a equanimidade  e a paciência fazem parte do caminho dos candidatos á libertação pelo Nirvana ...

Sendo assim, ele interrompeu sua meditação e passou a ouvir o pescador...

O pescador então falou:
- Como é difícil pescar em um rio que não tem peixes...

Surpreso com as palavras do pescador, Yang levantou-se e aproximando-se do pescador, disse:
- Senhor...
- Se esse rio não tem peixes, por que então o senhor está tentando pescar nele?

O pescador respondeu:
- Porque, meu jovem monge... Tudo é impermanente...

E continuou...

- Esse rio, um dia, foi cheio de peixes...
_ Pela pesca e ação do homem, os peixes desapareceram, mas, como esses peixes estão na roda de sansara, um dia eles voltarão a esse rio...
- Quem sabe se hoje não é esse dia?

Yang, surpreso com a resposta do pescador, se manteve quieto o tempo todo...

Então, o pescador continuou a falar...

- Veja jovem monge... 

Essas águas que estão passando agora no rio,
Não serão as mesmas que passarão...
E nunca são as que já passaram...

Por que disso?
Porque elas vão até o mar...
Lá deságuam...
Depois, passam pela evaporação...
Depois, viram nuvens...
Depois, novamente, caem em forma de chuva neste rio...
As águas voltam, mas já não são as mesmas...
Elas foram modificadas por todo o processo pelo qual passaram...

Sendo assim, o dia em que os peixes voltarem a esse rio,
Não serão os mesmos peixes do passado...
Serão outras espécies...
Com outros comportamentos...

E concluiu:
Aqueles peixes que um dia aqui estiveram...
Não mais voltarão...

Nesse momento, Yang parou e refletiu:
- Agora, entendo a frase dos sutras...
“Tudo que está sujeito a surgir está sujeito a Impermanência...”


- A Impermanência  está ligada ao processo de modificação eterna das coisas...

Como eu...
Que já fui Li Kong, o guerreiro marcial
Hoje sou Yang Ho, o monge pacifista...
Amanha... serei outro ser...

Assim como as águas do rio, nunca sou o mesmo...
Todos os dias estou me modificando...

O pescador olhou para Yang e disse:

- A impermanencia é o resultado da Roda de Sansara, ou seja:
Por mais forte e sábio que um ser seja, se ele não sair da roda, ele sempre será impermanente...
Uma hora, ele será um sábio aqui...
Outra... será um mercador ali...
E, todos os nomes e egos serão sempre diferentes...

O mesmo ser nunca se repetirá...

Yang, interrompendo o pescador, fez o seguinte questionamento:
- Meu amigo, o espírito das pessoas não permanece sempre o mesmo?

O pescador sorrindo respondeu:
- Se o espírito fosse o mesmo, todas as manifestações do ser seriam exatamente iguais sempre...

Yang ficou perplexo e disse:
- Até mesmo o espírito está sujeito a surgir e a cessar?

O pescador recolhendo a vara, disse:
- Tudo surge da ignorância, monge...
- se um dia a eliminar. não mais estarás sujeito a impermanencia...
- A roda de sansara só gira para aqueles que com ignorância desejam o impermanente...

Mas,
Aquele que realiza a sabedoria por si mesmo,
Quebra a Roda, e torna-se Um Arath,

Um sábio plenamente realizado se livra das amarras do surgir e do extinguir...

Yang finalmente entendeu a Impermanência e fez a última pergunta:
- Qual seu nome, sábio pescador?

O pescador sorrindo, respondeu:
Antes de falar meu nome, entenda bem isso:

- Toda manifestação transitória nasce do desejo e do apego ás formas e aos sentidos...
Tudo que surge, leva ao sofrimento,
Pois gera dor quando se consegue...
Ao se conseguir o que se deseja, se sofre para manter...
E, se sofre mais ainda  quando não se consegue supri esses desejo e apegos...

O desejo é a grande sede, que nem os maiores oceanos de água doce podem eliminar...

Agora, devo ir, jovem monge...

Tudo que Tathagata Ratnasambava lhe disse aqui foi o Dharma correto...

O pescador sumiu e Yang Ho, pela segunda vez na vida, esteve frente a um Budha...

A partir desse dia, Yang compreendeu que tudo que surge:
É impermanente...

E que:
A origem desse surgimento é o desejo...
Se eliminando o desejo...
Se elimina o surgir...

E, para se eliminar esse surgimento é necessário trilhar o nobre caminho óctuplo.

1. Compreensão correta das quatro nobres verdades que levam ao fim da ignorância...
2. Pensamento correto – que liberta o ser das amarras dos desejos e das enganações internas e externas...
3. Fala correta- que elimina a língua das mentiras...
4. Ação correta – que leva a eliminação de atos que levam á perdição em sansara...
5. Modo de vida correto – que faz com que um ser gere compaixão e não, ódio...
6. Esforço correto – faz o ser focar-se no que realmente é necessário para eliminar a Impermanência...
7. Atenção correta – leva o ser apenas para o que é benéfico em sua jornada de auto realização e sabedoria...
8. Concentração correta – o último derradeiro passado para se eliminar a ignorância através da meditação e do mergulho interno, levando o ser ao Nirvana ... 

Yang praticou com afinco o nobre caminho óctuplo e tornou-se um Arath anos depois...
Ficou mais alguns anos no templo ensinando o que descobriu...
Depois, viajou para o Norte...

Essas e outras histórias um dia serão contadas...


Esse é terceiro texto do Monge Yang Ho.

As primeiras histórias são:

Uma tigela de arroz, já postada aqui no blog:
http://evolucaodamenteodespertar.blogspot.com.br/2012/01/uma-tijela-de-arroz.html

E o Texto o Rato, também postada aqui no blog:
http://evolucaodamenteodespertar.blogspot.com.br/2011/08/o-rato.html

4 comentários:

  1. Amigo Irmão,


    Assim como as águas do rio, nunca sou a mesma...
    Todos os dias estou me modificando...

    Abraços Carinhosos

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  2. A mudança traz a liberdade... porém, “a conquista da liberdade é algo que faz tanta poeira, que por medo da bagunça, preferimos, normalmente, optar pela arrumação."
    Carlos Drummond de Andrade

    parabéns pelo blog - cada dia melhor!

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  3. obrigado pai por mais um texto para alimentar nossa mente com bons conhecimentos.

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  4. Excelente. Heraklito E Sidarta num cascudo só. Ass: Klaus do iate

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