terça-feira, 30 de agosto de 2011

O RATO



Há muito tempo atrás, existia um pequeno monastério budista no alto de uma grande montanha na província de Shichuan.

Nesse monastério vivia um grande mestr
e e sábio monge budista.

Muitos dos que com ele conviveram diziam que ele havia atingido o estado de iluminação. Outros, diziam que ele era um homem santo ou igual á montanha do monastério, velho e forte, mas passível de ser transformado pelo tempo...

Sem dúvidas, o mestre Yang Ho era muito sábio.

No monastério, os monges o procuravam para aprender sobre o Dharma e a vida, já as pessoas que viviam próximo sempre o procuravam para resolver problemas e disputas ou apenas para ouvir suas sábias palavras.

Nas imediações do tempo, até hoje se comenta de um caso de uma disputa onde o mestre a resolveu com uma sabedoria tão profunda que os dois homens que faziam parte dela largaram tudo e viraram monges.

Essa disputa já corria há meses...

Os dois homens já haviam brigado muito e resolveram procurar o mestre Yang Ho para ele avaliar e decidir quem estava certo...

Os homens chegaram ao monastério e pediram para falar com o mestre e logo foram levados ao salão de meditações, onde o encontraram meditando.

Após aguardarem cerca de três minutos, o mestre disse:

- Irmãos, o que pode ser pior que duas crianças brigando por um brinquedo?

Os homens então responderam:

- Não sabemos mestre...

O mestre então falou:

- Irmãos, o que pode ser pior que dois tigres lutando por um pedaço de carniça?


Os homens mais uma vez responderam que não sabiam.


O mestre então fez mais uma pergunta:

- Irmãos, o que pode ser pior que duas mães chorarem pela perda de seus filhos de joelhos frente a um pequeno pedaço de terra?

Um dos homens irritado disse:

- Sinceramente, não sei mestre... mas isso não tem nada haver com que viemos falar com o senhor...

O mestre então olhou para o homem e disse:

- Meus irmãos, vocês são as crianças, o pedaço de terra pelo qual vocês brigam é o brinquedo... Até aqui vocês agiram feito crianças... se provocando, fazendo birra e não sendo nem um pouco racionais...

- Como tigres, vocês deixaram as provocações infantis de lado e partiram para agressão, e o pior de tudo é que como a carniça, a terra que vocês disputam não é fértil nem boa para se construir nela...

- As mães que choram são suas famílias daqui há algum tempo... Quando vocês dois se matarem pelo pequeno pedaço de terra, que, no final, só servirá para ambos serem enterrados...


Depois disso, o mestre fechou os olhos e voltou a meditar...

Os homens sentiram tão forte as palavras do sábio Yang Ho que resolveram virar monges.


Voltando ao monastério que era um lugar simples, mas bem aconchegante...

Lá, os monges tinham o sossego e local adequado para aprender sobre o Dharma e meditar...

O monastério ficava no alto de uma montanha como já foi dito antes.

No centro, havia um belo jardim com algumas estátuas de Buda.

Nesse lugar, os monges plantavam e colhiam boa parte de seus alimentos.

Perto do jardim, ficava a dispensa onde eram guardados os alimentos colhidos e doados para as pessoas de vilas vizinhas...

É nessa dispensa que inicia nossa história.

Certo dia, um jovem monge estava na dispensa guardando alguns grãos de arroz que havia ganhado em uma vila próxima.

Ouviu um barulho atrás dos sacos de arroz e quando os puxou, havia um rato furando os sacos e comendo o arroz.

O monge então espantou o rato e terminou de guardar os grãos.

No dia seguinte, a mesma coisa aconteceu.

Desta vez, o monge pegou uma vassoura e correu atrás do rato que fugiu por um vão na parede.
Após este ocorrido, dia após dias o monge encontrava o rato e o botava pra correr. Muito nervoso, o monge resolveu contar ao mestre sobre o rato e também pedir que ele lhe dissesse como se livrar dele...

Eram três da tarde quando o jovem monge entrou na sala de meditação e pediu ao mestre que o ouvisse.

O mestre que estava mentalmente entoando o sagrado mantra “Om Mani Padme Hum” quando olhou para o monge e disse:

- Meu jovem, o que lhe faz ficar com o rosto tão fechado?

O jovem explicou a situação ao mestre que nada falava e só ouvia.


Ao terminar, o monge falou:

- Mestre, devemos nos livrar desse rato urgente antes que ele coma todo nosso alimento, ou pior, o estrague....

O mestre yang Ho levantou-se e falou:

- Vamos ver esse rato...

O jovem monge, empolgado, pensou:

- Agora me livro desse problema...

O mestre fez o caminho inteiro e nada disse. O jovem monge sabia que o mestre só falava na hora certa e não estranhou essa atitude. Ao chegar á dispensa o jovem monge rapidamente puxou os sacos de arroz e lá estava o rato...

O mestre olhou para o rato que estava comendo arroz e disse:

- Venha cá, meu amiguinho...

O rato passou correndo pelo jovem monge e ficou próximo aos pés descalços do mestre que abaixou e pegou-o, dizendo:

- Agora, meu amiguinho, me diga... qual a sua queixa contra meu jovem discípulo?

O rato então disse:

- Por centenas de anos minha família morou no topo da montanha, mas um dia, os homens chegaram e destruíram nosso lar. Depois de algum tempo, nossa família descobriu esse paraíso de alimentos. Todos os dias vínhamos buscar nossa comida, mas todos os dias esse jovem monge tenta me machucar... na verdade eu gostaria de pedir apenas que me deixem comer em paz e nada mais....

Ouvindo isso e muito espantado, o jovem monge abaixou a cabeça.

Então, o mestre falou:

- Meu amiguinho... pode comer o quanto quiser...vou resolver essa questão...

O mestre soltou o rato e chamou o monge para conversar.

Ele perguntou ao jovem:

- Me diga meu jovem... o que é pior? Um rato que apenas quer comer em paz ou um monge que quer se livrar de um rato que nunca lhe fez mal algum?

O jovem respondeu:

- Como não, mestre? Ele rouba nossa comida todos os dias...

O mestre continuou:

- A comida nunca foi nossa...

- Como o rato que não sabe a diferença entre o que é nosso e o que é dos outros, todos os dias roubamos da terra, seus grãos. Todos os dias colhemos arroz e outras tantas sementes que pertencem á terra e ás plantas que crescem nela... Depois dizemos ser nossos... portanto, como ratos, roubamos e não achamos que roubamos...

O jovem ficou pensando no que foi dito, mas já tinha outro argumento contra o rato e disse:

- Mestre, os ratos são sujos e causam doenças....


O mestre sorriu e falou:

- Por que sujos, meu jovem? Se falas isso é porque eles vivem buscando alimento na sujeira que nós humanos fazemos ou porque vivem próximo ás imundices que nós mesmos criamos...

- Somos tão sujos quanto eles, e até pior, sujamos o mundo que eles vivem... Então... sujos somos nós...

- Sobre eles causarem doenças, não vejo problemas... Nada mais doentio que a ação do homem no mundo...

- Nada causa mais dores que nossas mãos, portanto, as doenças que por acaso o rato pode causar, elas são menos graves do que nós humanos podemos fazer...

O monge já sem argumentos falou:

- Mestre, já parou para pensar como seria o mundo humano sem ratos?

O mestre respondeu:

- Seria um mar de lixo no qual nos afogaríamos sem ajuda de nossos irmãos ratos que tanto limpam nossas sujeiras... E você, meu aluno... Já pensou como seria o mundo dos ratos sem nossa presença?

O monge abaixou a cabeça e pediu para retirar-se.

Durante á noite, o jovem monge refletiu sobre o que o mestre havia dito e foi atrás do rato para perguntar o que ele acharia do mundo sem humanos. Encontrou-o morando atrás da dispensa com a mulher e os filhos...

O jovem monge chegou de mansinho e disse:

- Não tenha medo, rato... só quero lhe fazer uma pergunta...

O rato então falou:

- Faça e vá embora, pois tu assustas meu filhotes...

Rato, o que seria do mundo dos ratos sem os homens?

O rato, sem pensar muito, disse:

- Seria um lugar triste, afinal, apesar de muitos de vocês não perceberem, nós somos irmãos e qualquer irmão que suma é uma grande perda...

O jovem monge caiu ao chão chorando e disse:

- Obrigado, meu irmão rato... Por abrir meu olhos...

Desse dia em diante, o rato e jovem monge ficaram amigos.
O rato não precisou mais roubar, pois o monge todos os dias lhe levava comida...


Tempo depois, o jovem monge se tornou um sábio mestre e ficou no lugar do Mestre Yang Ho, que por volta dos setenta anos, partiu do monastério em direção ao norte.

As últimas palavras deixadas pelo mestre nunca foram esquecidas. Essas palavras foram:

- Ratos, homens e deuses, todos são irmãos. Que os budas abram os olhos de todos para essa verdade....

(Dedico esse texto a Mikael e Gabriel dois dos seres mais sábios que já tive e tenho oportunidade de conviver)

4 comentários:

  1. Não é fácil ver essa foto.Eu tenho fobia de rato.

    Eu já ouvi uma história um pouco parecida sobre os insetos.Humanos invasores.

    E tem aquele templo na Índia dedicado aos ratos onde eles bebem leite.
    Não deve ter sido à toa que o Walt Disney escolheu um rato para mascote do seu Império.

    Conclusão:"Só sei que nada sei"

    Boa Tarde!

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  2. Fiquei emocionada com essa história...
    Agradeço...

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  3. Espero que chegue o dia em que o ser humano tome consciência de que somos todos irmãos.
    Obrigada por compartilhar seu conhecimento.
    O senhor é o melhor mestre que alguém poderia ter.

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